Está perto o apagar de luzes do mês de maio. Este mês encerra uma data especialíssima, o 13 de maio, da assinatura da lei Áurea em 1988, quando se deu oficialmente o fim da escravidão a que era submetida a população negra. A data perdeu um pouco do prestígio com o advento do 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra, que amrca a morte do líder Zumbi, do Quilombo dos Palmares, resistindo até o extremo em defesa da tão sonhada nação livre. A luta pela liberdade requer sacrifícios, nos tempos de agora, requer, às vezes, intervenção da Polícia Federal.
Foi assim que chineses mantidos em situação de trabalho escravo foram libertados na última sexta-feira [22], em pleno Centro de São Paulo. A investigação sobre tráfico de pessoas, imigração ilegal e escravidão começou no estado de Rondônia e desembocou em um prédio velho na Rua Augusta Severo, 7, que é paralela a um trecho da Rua 25 de março, maior centro de comércio popular da capital.É nessa rua que centenas de chineses armam pequenas barracas onde vendem bolsas e cintos que ostemtam nomes de grifes famosas, além de toda sorte de quinquilharias. Os produtos são, obviamente, produzidos por mão-de-obra escrava trazida da China. E é aí que está um dos elos entre o crime e comércio, entre a história e o presente.
Os agentes chegaram no início do amanhancer. Duas ruas foram interditadas, o cerco realizado e cerca de 40 pessoas, entre elas algumas crianças, foram libertadas pelos agentes que ostentavam armamento pesado. Estavam prontos para um possível confronto com a tão falada e pouco vista máfia chinesa.Até onde foi possível testemunhar, não houve necessidade do uso de força. Aos poucos, pessoas assustadas era trazidas para fora do prédio. Na calçada, cercadas por jornalistas ansiosos por informações, venciam rapidamente o pequeno trajeto até um dos três ônibus que as levariam até a Superintendência da Polícia Federal. Homens e mulheres tentavam esconder o rosto das câmeras fotográficas e filmadoras. Os escravos modernos não comemoravam a libertação. Pareciam assustados.
A barreira da língua entre chineses e brasileiros é interessante. Eles a transpõem com muito mais facilidade. Mas não tente conversar com um deles num momento de tensão. Nem que seja com o intuito de ajudar. Eles se fecham.
Na época da escravidão negra, as expedições em busca de vítimas na África eram aterrorizantes. Entretanto, muitos dos que aportavam por aqui eram capturados por negros em guerras tribais e vendidos a traficantes de escravos europeus. Não havia promessa de vida melhor. Uma vez arrancados de seus territórios, sabiam que teriam pela frente algo próximo do que se imagina ser o inferno. Os chineses abraçam o êxodo porque acreditam na possibilidade de obter progresso material fora de seu país, cujo gigantismo econômico contempla muito pouco entre os mais de 1 bilhão de habitantes.
Passados 121 anos da lei Áurea, o mês de maio tem uma aura de libertação inesgotávelmente perseguida por todas as pessoas que se sentem, de alguma forma, reféns de um modelo social fincado pela estaca do privilégio e da ganância. Sejam de que etnia ou nacionalidade for a escravidão sempre será uma sombra sobre os pobres. Nada que provoque espanto num tempo em que 'minoria' determina, na verdade, os que detêm a menor parte do PIB e por sucessivas gerações ficam com o farelo que cai enquanto o bolo é repartido.
Caçando assunto - Cid Barboza cid@metronews.com.br
Metrô News - 25/05/2009